Opinião

Pandemia, clima organizacional e o líder

07/07/2020

 Ruptura. Essa a palavra chave para o cenário atual em todas as frentes no Mundo todo. Muito do que ligava, rompeu-se abruptamente. Romperam-se: os apertos de mão, os abraços, os tapinhas nas costas, o falar pertinho, as reuniões a portas fechadas, as aulas presenciais, as palestras, os programas de auditório, os ofícios religiosos, o almoço de família aos domingos, os churrascos em feriados e fins de semana entre aqueles mundões de amigos ... Bem, a lista é infinda.

Nas empresas, romperam-se a convivência diária no escritório, já que muitos foram para o
home office; as reuniões entre setores; a revisão cara-a-cara dos resultados e desempenho. O convívio nos refeitórios, as brincadeiras de toques, a fila apertada no cartão de ponto, as trocas de informações no cafezinho, tudo trocado por distanciamento. Mudaram normas e regras: a venda por telefone, antes proibida, agora é norma; as visitas a Clientes é que estão proibidas. Trazer pessoas para conhecer a empresa, antes norma, agora, proibido. Treinamentos presenciais, dentro e fora da Empresa, substituídos por EaD ou AaD, ou até o TaD.

No entanto, um fator comum premeia o ambiente familiar, pessoal, e o Organizacional, coletivo: a desinformação! Nunca antes tivemos tantas mensagens trocadas, tanta notícia imediata, tantas opiniões, tantos fatos comprovados. Mas nunca tivemos tantas notícias falsas, notícias enganosas, fatos deturpados, estatísticas enviesadas, normas de comportamento conflitantes. Nem bem começa um acontecimento, já outro surge, e outro e outro: vírus, Antifas, BLM – Black Lives Matter, Apagar o Passado Politicamente Incorreto, pedir perdão aos que meus ancestrais magoaram, e por aí vai. O ambiente resultante, em todo o Mundo, está sendo de enfrentamento, de animosidade, de conflitos e até de ódios. A polarização, ideia que antes remetia a “dois polos”, duas posições opostas, a partir de agora traduz vários “polos”, várias posições opostas, pode-se dizer que “todos contra todos”. O lema dos Três Mosquiteiros de Dumas, “Um por todos, todos por um”, passa a ser “um contra todos, e todos contra um”.

É dentro de cenário confuso e tenso que se encontra nosso objeto de interesse neste artigo: a Organização e seu Líder nesses tempos de Pandemia.

Uma empresa, enquadrada nas essenciais, para a qual presto Consultoria fez uma reunião com todos os seus colaboradores logo no primeiro dia do confinamento. Uma reunião proposta, aprovada, preparada e treinada pelo “grupo de crise”. Os dois sócios à frente. Começaram dizendo que iríamos viver dias muito difíceis, viver imensos desafios, que nos marcariam para toda nossa vida. Teríamos todos que fazer sacrifícios. Mas que, ao final, nossa empresa sairia mais forte, e nossa equipe mais competente e aguerrida. A meta nesse período era preparar a empresa para a retomada. Faturamento, inadimplência, despesas e custos foram mostrados em gráficos e números reais. A queda de receita foi projetada, e com base nela, a necessidade de reduzir custos e despesas.

Anunciaram a primeira despesa a ser cortada: o
pro labore dos sócios, integralmente.  Os funcionários iriam ter a jornada de trabalho reduzida, e seus salários proporcionalmente. Os funcionários foram orientados sobre as alternativas do Governo para recompor suas rendas, como deviam cadastrar-se e quando iriam receber. Os Gerentes e outros profissionais com rendimento maior foram solicitados a contribuir com cortes maiores. A adesão foi total. Até surpreendentemente total.

Além disso, horário reduzido no atendimento. Home office. “Podem levar os notebooks da empresa?”
  Sim, mas cuidado... Quantas perguntas. Como fazem faltas referenciais. Quem já fez isso? Vamos adiante. Mas, tanto os colaboradores quanto os Líderes tiveram que se reinventar. Desaprender o que sabiam. Aprender o que ninguém ainda sabe. Desconstruir e construir. Sem tempo, sem parar. Já.

Como manter produtivas as pessoas que não estão no escritório? Como saber se o que precisa ser entregue ao Cliente amanhã cedo está sendo feito? Feito certo? Como acompanho meu pessoal e seu trabalho? O trabalho remoto nunca havia sido testado!

Ah! Mas tem o Whatsapp, o Telegram, o Skype, o Messenger, etc... Sim, mas e se o Líder não ouve o sinal do smartphone e só vai ver a pergunta uma hora mais tarde? E se tem telefonemas e textos demais para ler? E se o técnico dormir até tarde e não terminar seu laudo? Será deselegante ligar para ele? Afinal, é a casa dele, não o escritório. E se a esposa ou a filha atender? Todas essas questões tiveram que ser enfrentadas. E estão sendo enfrentadas.

Um dos sócios começou a fazer acompanhamentos de sua casa, via vídeo. Via se as pessoas estavam vestidas para trabalhar, mesmo que mais informalmente. Via se estavam mesmo trabalhando. E pedia retorno e perguntas a ele. Outras lideranças fizeram o mesmo. Assim, o acompanhamento individual foi feito, e se revelou muito positivo, pois a aspecto “fiscalização” desapareceu e em seu lugar entrou a troca de ideias e a colaboração, o interesse e a atenção da liderança querendo ajudar. Há trocas de recomendações de
lives e cursos rápidos EaD, entre todos. As lideranças têm recomendados lives durante o horário de trabalho, e cobrado o aprendizado. Os sócios comentam as lives que eles assistiram e os cursos que fizeram ou estão fazendo.

Notícias importantes são comunicadas em grupo de W
hatsapp. Todos os dias, orientações sobre cuidados a serem tomados em termos de higiene, proteção individual, cuidados com as pessoas. Reuniões com clientes e fornecedores são feitas via Zoom ou Skype ou outro aplicativo. Curiosamente, os horários têm sido cumpridos. Os comunicados mais críticos e relevantes são feitos em reuniões – agora com espaçamento recomendado, e demais cuidados.

Logo no primeiro dia, todos receberam EPIs para a pandemia, e como orientar e lidar com os Clientes presenciais. As máscaras receberam o logo da Empresa. Depois, para os mais expostos, os Face Shields também com o logo da Empresa. Mas, tem sempre um que vem com uma máscara diferente, com escudo de seu time, ou uma caricatura ... Sem problemas.

Mais que em qualquer outra época, os sócios estão junto aos colaboradores a maior parte do tempo, quer presencialmente quer via digital. Vários processos foram mudados, e a busca de eficiência aumentou. O moral está elevado. Comunicados para os Clientes tem sido elogiados, pois um “moto” forte foi criado e está sendo sempre repetido, de confiança no País e nas pessoas. Os colaboradores estão orgulhosos que sua empresa está sendo elogiada. Mesmo o desligamento de um colaborador foi absorvido de forma positiva, pois tudo foi feito muito às claras. No auge do confinamento, a empresa abriu uma filial. Isso confirmou a confiança no futuro que os sócios falaram na primeira reunião.

Dois fatores críticos se destacaram nesse período: o exemplo dos líderes e a visão de futuro manifesta e demonstrada. 
Num país culturalmente “viciado” em privilégios e favorecimentos, quando a liderança dá o exemplo, parece que há um choque.

O Empresário, o Gestor, o Administrador brasileiros devem compreender que o maior nível educacional da média das pessoas e apenas sua exposição a movimentos por maior conscientização de sua cidadania fatalmente levarão os colaboradores a perceberem mais que o verdadeiro Líder dá o exemplo. Modela. Orienta. Estabelece a maneira de ser. Estimula comportamentos. O dito: “faça o que eu digo, não faça o que eu faço” , está fadado ao escárnio e ao descrédito, se é que ainda não foi enterrado. O Líder verdadeiro “demonstra o que se deve ser”. Vive suas palavras. Tangibiliza seus valores. Assim, de tanto agir com base no que crê, seus valores tornam-se sua personalidade, e daí o comportamento fica em sintonia com as atitudes, os valores. Resultado: competência!

O outro quesito é a visão de futuro. Não aquela transcrita em todo Plano de Negócios: ser referência ... blá, blá, blá. Mas um verdadeira e honesta antevisão de como será a Empresa em um ponto futuro, digamos, ao fim da pandemia, ou do confinamento. Como será a empresa? Como estarão seus colaboradores nesse cenário futuro? Falar sobre isso é importante. Sempre. Em cada oportunidade. Em cada mensagem do whatsapp. Mensagens com o conteúdo relacionado ao que se quer que a Empresa seja.

Nada de piadinhas sem relação com nossos negócios. Até as piadinhas devem estar em sintonia com o que se espera dos colaboradores e como se vê o futuro da Empresa. Nada de cobranças individuais no Grupo. Mas elogios, sim: “o Fulano conseguiu fazer tal coisa junto ao Cliente tal. Parabéns, Fulano!” Mensagens de fundo político, nem pensar! A Empresa tem que ser neutra. Cada um tem seu posicionamento político e ideológico, mas a empresa não tem partido. Mantenha seu time unido e coeso em torno do futuro da empresa, que é o futuro de todos.

Frequentemente lemos que o momento é de desaprender e reaprender. Sim. Os meios de comunicação nunca foram tão importantes para as Empresas e seus Colaboradores e Clientes.

O que permanece é o conceito de Liderança: “a habilidade de influenciar pessoas para trabalharem entusiasticamente visando atingir os objetivos identificados como sendo para o bem comum”. (Hunter, J.C. O monge e o Executivo. P. 25, Rio de Janeiro, Sextante: 2004)

O maior desafio dos Líderes, hoje, é aprender a utilizar os mais variados canais de comunicação para implementarem os mesmos princípios que cercam esse papel.

Autor (a):
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João Viggiani

Economista, especialista em Gestão Hospitalar, professor e consultor de empresas. Ministra aulas na Graduação e Pós-Graduação da Toledo Prudente Centro Universitário.